Tiro no peito
Marcos Cripa comenta sobre a retirada de pauta do projeto do IPTU
O jornalista Marcos Cripa comenta sobre a decisão do prefeito em retirar de pauta o projeto de revisão da planta genérica do IPTU.
O prefeito de Poços de Caldas, Sérgio Azevedo, demonstra ao longo desses quase dez primeiros meses de mandato que a administração se comunica muito mal com a população.
Ele aparenta acreditar que a internet resolve todos os problemas e opta por usar gravações em vídeo nas redes sociais para “falar direto” com os munícipes. Mas, invariavelmente, adota postura muito mais de quem quer mandar recados para os que não o apoiam do que propriamente falar “ao pé do ouvido” com a população poços-caldense.
Na última sexta-feira (22), no entanto, o que já estava ruim, ficou pior. A comunicação se rompeu. Ao retirar da Câmara Municipal o projeto de revisão da Planta Genérica de Valores do Município – que incide diretamente no valor para maior do IPTU – horas antes da realização de uma Audiência Pública, Azevedo não só deu um tiro no pé como apontou um canhão para o próprio peito e acendeu o estopim, jogando por terra, aparentemente, o capital político que vinha construindo até aqui, mesmo que de forma titubeante.
Não sei se o caminho para a retirada do projeto se deu porque ele encontrou erros que os técnicos da prefeitura possam ter cometido na elaboração da proposta, ou passou a temer uma reação ainda mais negativa que sua ação já havia provocado na população.
Com essa medida, o marketing de que faria um “governo técnico” cai por terra. E no lugar não nasceu um governo político. Ou seja, nem um nem outro, o que é péssimo. A bem da verdade, nem mesmo a base de sustentação do prefeito na Câmara, que é ampla, estava convencida da viabilidade do projeto ser aprovado tal qual foi enviado.
E não tinha como os vereadores da base estarem afinados com o discurso do governo, tal o volume de desinformação. Mesmo eles que são, digamos assim, da cozinha do gabinete do executivo, estavam sem saber como defender tal proposta. Imagine então o restante da população.
Dezenove horas antes do recuo, o prefeito afirmava no programa “Veracidade”, do jornalista Wiliam Oliveira, na MAK Rádio, que estava disposto a dialogar com a população na Audiência Pública e admitia, inclusive, rever alguns pontos que pudessem tor nar o projeto exequível.
Mas na hora “H”, Azevedo jogou por terra tudo que vinha dizendo nas últimas semanas. O projeto virou pó e seus aliados ficaram sem reação, como se comprovou na Audiência Pública que, mesmo com a retirada do projeto, teve garantida a fala dos inscritos. Recuar e retirar o projeto que ele mesmo enviou à Câmara é facultativo do executivo.
O prefeito pode fazê-lo a qualquer tempo. Portanto, é um direito dele. Mas convenhamos, precisava fazer isso quando a população já se dirigia à Câmara Municipal para a Audiência Pública depois de semanas de debates envolvendo o IPTU nas TVs, rádios, jornais e redes sociais? Precisava chegar a esse ponto?
O bom senso político indica que o correto seria Sérgio Azevedo ter feito o recuo dias antes da audiência, dando à população as informações necessárias, as justificativas pertinentes. Ou então retirar o projeto mais à frente, após amplo debate na Audiência Pública tendo dela participado argumentando e anotando as sugestões da população. Certamente ouviria críticas, mas elas fazem parte do jogo político.
Se tivesse agido assim, o prefeito teria saído do imbróglio de cabeça erguida. Preferiu omitir-se do debate na Câmara e permaneceu no gabinete, jogando aos leões três de seus secretários, a saber: Alexandre Lino Pereira (Fazenda), Fábio Camargo de Souza (Procuradoria) e Tiago Cavelagna (Planejamento). Os homens de confiança do executivo foram engolidos na Câmara pela oposição constituída basicamente de dois vereadores (de um total de quinze) e viram-se provocados até por cidadão que nunca primou pela seriedade em suas falas e textos.
A situação foi tão vexatória para o governo que os secretários descreviam na Câmara situações de forma desconexas como se não estivessem devidamente preparados para o embate. Chegaram a concordar com observações de opositores como se não representassem o governo. Ao retirar da Câmara o projeto que havia enviado para a análise, Azevedo criou uma Comissão para discutir e apresentar propostas para o envio de um novo projeto de revisão da Planta Genérica de Valores do Município.
Esta Comissão, segundo proposta do prefeito, deve ser integrada por representantes do próprio executivo, do legislativo e da sociedade civil organizada. Verdadeiro contrassenso e falta de lógica nessa proposta do prefeito. Se era para ser assim, bastava Azevedo manter o projeto original e comparecer à Audiência Pública. Lá estavam o legislativo e a sociedade civil. Só ele mesmo não compareceu representando o executivo!!!
* Marcos Cripa é jornalista e professor universitário. E-mail: mcripa@uol.com.br