Pugilato, afagos e circo
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A mão que se aperta é a mesma que pode te dar um soco. Parafrasear Augusto dos Anjos é irresistível no contexto pós-cadeirada em debate eleitoral.
Eu nunca havia visto pessoalmente um debate político televisionado, apesar de já ter entrevistado presidenciáveis (Ciro Gomes, Aécio Neves, Lula) e inúmeros políticos em coletivas.
No dia dois de outubro deste ano, a convite do jornalista Rodrigo Costa, isto mudou: fui ao debate dos candidatos a prefeito de Poços de Caldas organizado pela TV Plan e Jovem Pan Poços. Após as eleições que consagraram Paulo Ney, por que isto interessaria ao leitor?
Creio que além dos resultados eleitorais, das notinhas perecíveis de bastidores sobre cargos, rusgas e acertos, o que realmente interessa não é dito às claras nos microfones: as relações de poder precisam ser observadas como um documentarista da era do Cinema Direto, que procurava não ser notado, para que o público compreenda seus mecanismos, pois estes são, aparentemente, imperecíveis, ainda que mudem vagamente de configuração.
Logo na entrada do Palace Casino, pouco antes da contenda, identifico-me como convidado do Jornal da Cidade e a recepcionista simpaticamente encaminha-me para a antessala onde os candidatos estão concedendo entrevistas antes do debate.
Dispenso; afinal o pernicioso jornalismo declaratório é justamente o que desejo evitar e, afinal, Gay Talese escreveu o lendário perfil de Frank Sinatra sem jamais conversar com ele; redigiu-o apenas frequentando os mesmos lugares.
A questão é que estou mais para Hunter S. Thompson e logo sou notado por amigos, alguns deles candidatos ou assessores. Então alguma participação ínfima eu ainda tenho nos fatos. De qualquer forma, consigo circular o suficiente para ficar sozinho em vários pontos estratégicos.
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Logo noto algo que serve de lição, ao menos para mim: sabem aquele clichê recente que diz que enquanto famílias brigam por políticos eles trocam abraços em Brasília?
Não precisa ir tão longe: jamais entrem em brigas em redes sociais entre diferentes atores políticos, mesmo aqueles de último escalão.
Vi dois inimigos figadais que trocaram acusações aniquiladoras numa rede social, meses atrás, cumprimentarem-se efusivamente. Isso é digno de nota, pois foi uma exceção, como se verá a seguir.
A disposição de como estava a entourage de cada candidato, mais do que eles disseram, mais do que as provocações em frente às câmeras, mais do que frisson diante das gafes (como as risadas de mofa após os três “seje” de Marcelo Heitor justamente quando ele falava sobre educação), é o que mais revela a dinâmica do poder.
Mais do que isso: a parca interação entre os partidários dos quatro convidados cujos partidos ultrapassaram a cláusula de barreira é o que dá o tom.
Há uma tensão muda, ninguém fala alto, embora cada claque esteja relativamente isolada. A de Ulisses Guimarães é a mais numerosa e está quase só do lado esquerdo da plateia.
Na outra fileira de cadeiras, do lado direito, atrás dos diretores da TV, estavam, sucessivamente, as turmas de Eloísio, de Paulo Ney (ínfima) e de Marcelo Heitor.
Já fui a uma luta de boxe; não houve golpes baixos como os que foram dados em frente às câmeras. No entanto, cabe outra metáfora esportiva.
Os times de cada candidato podem ser refratários e antipáticos uns com os outros, mas o fato é que devem trocar de camisa facilmente e jogar ao lado de quem nem sequem agradeceram por uma mesura desinteressada.
Muitos, senão todos, a depender do escrete, estão ali porque desejam um gabinete na antessala do poder. E os terão. Eventualmente, ao lado do inimigo de agora. Não cabe aspas em inimigo.
Não há muito republicanismo num ambiente desses; não são mero adversários, como gostam de ressaltar. Quem pode levar uma bala perdida nesse tiroteio metafórico? Nós, claro. Geralmente, as únicas vítimas.
* Daniel Souza Luz é jornalista, escritor e revisor. E-mail: danielsouzaluz@gmail.com