Pequeno Segredo representa o Brasil no Oscar

Filme concorrerá na categoria Melhor Filme Estrangeiro

O crítico Marcelo Leme comenta sobre Pequeno Segredo, filme brasileiro que representará o país no Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Um plano aéreo abre o filme mostrando a imensidão do mar rumando com suas ondas até uma praia. Um belo plano que mais tarde ganhará contornos bem interessantes.

Na sequência, um grupo de pessoas está nessa praia no que parece ser uma celebração. Um plano detalhe mostra uma mão segurando uma outra. Bem cafona. Entre belos e péssimos momentos, Pequeno Segredo se constrói entre narrações em off de pessoas distintas, unindo pelo menos três histórias que se costuram graças a um acontecimento, este que justifica o título no novo trabalho de David Schurmann.

Baseado em uma conhecida história familiar do próprio diretor, a obra se curva para a personagem de sua irmã caçula, Kat, trazendo os esforços da menina em aprender os passos para uma apresentação solo de ballet na escola – ação que traz uma consideração fantasiosa à serie de acontecimentos –, ao mesmo tempo que trata da relação desta menina com a família Schurmann.

Consoante a isso, acompanhamos uma história paralela, o romance entre a paraense Jeanne (Maria Flor) e o neozelandês Robert (Erroll Shand). Flashbacks estruturam o presente da narração e a narrativa, lotada de momentos desnecessários graças a um roteiro que visa abranger muito mais do que precisava, acaba sendo demasiada pedante. Os 60 minutos iniciais são duros de aguentar.

Frases soltas em diálogos constrangedores e cenas dirigidas como se fossem parte de algum vídeo motivacional de whattsapp se somam contribuindo com uma experiência inicial desastrosa até que, já iminente ao fim, dá uma considerável melhorada. Aí notamos: havia um belo filme ali! Destaco especialmente a cena em que assistimos uma baleia encalhada numa praia e a batalha dos habitantes em banhá-la a fim de mantê-la viva.

Um signo de cuidado retratado magistralmente. O fim se concentra no que realmente interessa, coisa que a primeira hora de projeção, com tanta informação desnecessária e tentativa de dar alguma profundidade aos personagens, não buscou concentrar. David Schurmann entrega um filme bonito que melhora com a trilha do ótimo compositor Antonio Pinto.

Mas perceba, a trilha por vezes é forçada por uma decisão de direção, fazendo com que alguns instantes sejam muito mais dramáticos do que precisavam ser. Foge ao contexto e a empatia não se sustenta. Afirmo isso diante a percepção do imensurável carinho de David por sua irmã, Kat.

Essa afeição fundamenta o desejo do diretor em referenciar a história de sua irmã, no entanto muito mais sabota a obra do que contribui com ela. A jovem Mariana Goulart que vive Kat faz uma parceria bem interessante com Júlia Lemmertz, intérprete de Heloísa Schurmann. Juntas representam o que há de melhor em toda a obra: a representação do cuidado.

De toda forma, Pequeno Segredo, filme escolhido para representar o Brasil no Oscar, é sobre família; e é bastante íntimo e importante, apesar de seus problemas os quais acredito terem sido devido a demasiada preocupação do cineasta em fazer do todo uma declaração de amor pra lá de sentimentalista quando podia ser um terno registro de uma significativa e inesquecível história.

* Marcelo Leme é psicólogo e crítico de cinema. E-mail: marceloafleme@gmail.com