Ordem do Dia 02/10/23

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Na coluna Ordem do Dia, o historiador, advogado e cientista político Marco Antônio Andere Teixeira faz uma breve análise sobre fatos do dia. 

Em 1891, a encíclica “Rerum Novarum” (das “coisas novas”, em tradução livre), teria marcado um ponto de inflexão na Igreja Católica. Trouxe a questão social para o centro da discussão canônica.

Desde então, inúmeras iniciativas fizeram da Igreja uma grande difusora de ações sociais, visando a proteção e o resgate dos segmentos mais frágeis da sociedade.

Em paralelo, a mesma preocupação social se tornou relevante nas questões de governo, culminando no que conhecemos por “Estado do bem estar”. Uma doutrina voltada para a inclusão e equalização econômica, social e cultural das pessoas, em geral, através de diversos serviços, ou políticas públicas.

Previdência social, saúde e educação se posicionaram entre as prioridades governamentais. Mas não seria suficiente.
Limitações próprias das atividades religiosas e o esgotamento das alternativas promovidas pelo Estado, fez crescer o chamado “terceiro setor”.

Motivado pelas mesmas questões, o terceiro setor ampliou o espectro dessas demandas. No Brasil, um modelo de terceiro setor foi forjado ainda no século XVIII, mesmo antes da Independência: seriam as santas casas e as irmandades. Essas últimas contavam, inclusive, com a participação de escravos, até mesmo como dirigentes.

Nem estatal, nem privado, nem religioso, utilizando- se de recursos públicos e privados, esse segmento propôs novas agendas, de ordem ambiental, cultural, esportiva, de direitos humanos, de proteção das minorias, dos animais, etc, etc.

Segundo o IBGE, em pesquisa de 2016, além do voluntariado, o terceiro setor teria se tornado o segundo maior empregador do Brasil. Atrás somente do Estado, em suas diversas esferas. O terceiro setor empregaria mais que a indústria, que os serviços ou o agronegócio.

Sorrateiramente, suas atividades resultaram em nova modalidade de ativismo político, para além da participação eleitoral ou político-partidária.

No último domingo, o Brasil elegeu 30 mil membros para compor os “conselhos tutelares”, nos mais de 5 mil municípios brasileiros.

O Conselho Tutelar seria uma instituição que não é tipicamente estatal, nem religiosa, nem privada, mas é voltada para o interesse público. Seria algo parecido com o terceiro setor. Só que tratando de formas alternativas de participação e controle de atividades administrativas, de maneira autônoma. Ou “supra” estatal. E descolada da política partidária ou ideológica.

Indicando que a participação política tradicional, com todos os seus desgastes e polêmicas, vê crescer uma nova modalidade concorrente, de se exercer a cidadania.

Não através de teses enigmáticas, mas realizando ações concertadas e bastante objetivas. O bloco do terceiro setor, e seus assemelhados, está nas ruas. Resta saber se entraremos nesse ritmo.

* Marco Antônio Andere Teixeira é historiador, advogado, cientista político (UFMG), pós-graduado em Controle Externo (TCEMG/PUC-MG) e Direito Administrativo (UFMG) e Ciência Política. E-mail: marcoandere.priusgestao@gmail.com