O sucateamento do serviço público

Particularmente, sempre fui usuária de serviço público. Quando criança, tive plano de saúde por conta do bom emprego da minha mãe na época, mas tenho memórias de mesmo assim frequentar postinhos de saúde, o do centro da cidade, especificamente.
Inclusive a médica que atendeu minha filha anos depois foi a mesma que me atendeu, mas isso não vem ao caso agora.
Depois que fui mãe aos 18 anos, comecei a frequentar exclusivamente o serviço público, logo, estou familiarizada a esperar a manhã inteira para ser atendida, apesar da hora marcada, de ter minha vida pessoal julgada por alguns médicos mais conservadores e também, salvo exceções, ser grosseiramente atendida.
Apesar disso, nunca pensei em buscar adquirir um plano de saúde, porque isso não faz parte da minha realidade.
Não cabe no meu orçamento, nem o mais simples deles. Então, sempre insisti e sigo defendendo a saúde pública e o SUS sobre todas as coisas.
Porém, infelizmente, nos últimos anos, sinto uma crescente no descaso em relação a saúde da população.
E sim, talvez o antigo e o novo prefeito venham com dados maquiados dizendo sobre o quanto melhorou, mas será realmente que nós, enquanto população, vivenciamos isso?
Nesse momento, estou aqui sentada na UBS Vilas Unidas. Linda. Tem pinturas na parede de uma artista da cidade, fiz um workshop com ela, maravilhosa. A sala de espera é arejada. As poltronas são confortáveis, tem espaço.
Estou aqui esperando faz 2 horas. Segundo a funcionária da recepção, todos os funcionários estão trabalhando normalmente, então cabe a mim compreender que esse é o funcionamento normal.
Vim até aqui pois estou com a garganta inflamada, com placas de todos os lados. Fui medicada adequadamente há 2 dias, por um médico plantonista da UPA.
Ele sugeriu tomar uma injeção, porque apesar de já estar tomando ibuprofeno e paracetamol, minha febre não abaixava e a dor não parava.
Fiquei relutante, a injeção faz doer o corpo inteiro e eu queria ter uma boa noite de sono, pois precisava trabalhar no dia seguinte, mas, gentilmente, a enfermeira me convenceu.
Quando ela foi buscar viu que a medicação não estava disponível, assim como outros remédios básicos como dipirona.
Tive que me contentar com os compridos que receitou. Como era de noite, não havia farmácias populares abertas, fui na que tinha um desconto maior. Foram 140 reais de remédio.
No dia seguinte, fui ao postinho, como o médico plantonista sugeriu, para fazer acompanhamento e ver se poderia ser amigdalite, considerando que eu relatei que no ano anterior eu fiquei com a garganta inflamada quase todos os meses.
Cheguei às 8h da manhã. Já não tinha mais vaga para me atender. Na triagem, a enfermeira me explicou que teria vaga em abril, ou que eu poderia tentar chegar às 7h da manhã no dia seguinte, para conseguir uma senha.
Hoje cheguei 10 para às 7h. Já tinha 30 pessoas na minha frente, mas segui e ainda estou aqui, esperando.
Agora, vamos aos detalhes e às considerações das economias burras que vemos dentro do serviço público.
Como disse antes, ano passado fiquei doente todos os meses. Ora dor de garganta, ora virose ou gripe forte.
Sempre vinha aqui, nesse mesmo postinho, atendida pelos mesmos médicos e ouvia sempre a mesma coisa, “você é professora, né? É normal, escola é antro de virose”, “não, não tem problema tomar antiinflamatórios todo mês, tá tranquilo”, “pedras nos rins? Mesmo se alimentando bem e tomando três litros de água por dia? Normal, pode ser genético”.
Pois então, não era para nada disso ser normal. Sabe o que ajuda a disseminar doenças? Falta de higiene. Nas escolas não tem sabonete líquido, álcool em gel ou máscaras disponíveis para crianças e professores.
Sabe o que pode ocasionar pedras nos rins? O uso indiscriminado e recorrente de antiinflamatórios.
Sabe o que faz professores se afastarem da sala de aula durante o ano?
Doenças, problemas na garganta, amplificados pela quantidade de alunos dentro do mesmo espaço, salas não ventiladas e mofadas.
Nesse momento, os servidores públicos estão em greve. Não só por salário (o que também é justo, considerando que, como professora, eu gastei 300 reais para começar o ano com material adequado para mim e para as crianças), mas por condições dignas de trabalho.
Eu não quero ter que me afastar todo mês por questões de saúde, e caso precise me afastar, eu não quero perder o dia inteiro atrás de um atendimento digno. Nesse momento está batendo três horas de espera. Vou seguir esperando.
* Mariana Teodoro Nascimento é professora
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