O “escândalo” da carne

Paulo Tadeu critica o processo midiático em que se transformou a Operação "Carne Fraca"

O vereador Paulo Tadeu comenta sobre a operação “Carne Fraca”, sobre repercussão da ação da Polícia Federal na fiscalização de frigoríficos.

A operação policial federal na última sexta-feira, dia 17 de março, marcada pela escandalização e pirotecnia midiática, denominada “Carne Fraca” teve o condão de jogar no lixo um trabalho de mais de meio século, envolvendo dirigentes políticos de todas os matizes, universidades, centros tecnológicos, técnicos de reconhecida competência mundial, cientistas, zootecnistas, médicos veterinários, geneticistas, agronômos, nutricionistas, produtores rurais, empresas públicas de fomento, laboratórios, empresas de transformação, diplomatas, fornecedores de insumos, enfim, toda uma ampla rede de trabalho e persistência que colocou nosso país como o maior exportador de proteína animal do mundo.

Segundo a PF, nós, brasileiros, comemos papelão, carne de cabeça de porco, carne podre, restos de frango, camuflados com doses cavalares de ácidos conservantes. Exportamos para o planeta a mesma porcaria, porque somos um país de Zé Cariocas, como bem nos rotulou o Mr. Disney, para que tivéssemos a certeza ainda nas primeiras leituras, que malandragem é nossa maior arte.

O pânico tomou conta. Com razão. Nesta segunda-feira, dia 20, três dias após a sentença da Polícia Federal, alguns países do mundo suspenderam a importação da carne brasileira, que representa quase 8% das nossas exportações, dependendo do ano. Uma das poucas áreas que não vendemos a matéria-prima bruta perde mercado, porque a nossa carne tem papelão e ácido, segundo a polícia federal.

A insegurança dos consumidores já se reflete nas gôndolas dos supermercados, restaurantes e açougues – a carne é fraca, a carne é podre, a carne tem papelão, a carne tem ácido, segundo a Polícia Federal, que analisou os produtos de um único frigorífico, generalizou e jogou duas das maiores empresas mundiais do setor no lixo de suas convicções.

Conversei com algumas pessoas que me diziam horrorizadas que a carne era arrancada mecanicamente da cabeça do porco e da carcaça das aves. Mecanicamente, já imaginou mecanicamente?! O que significa mecânica?

Entre outras definições, pode se dizer que é uma atividade relacionada às máquinas e mecanismos. Ora, se é algo relacionado ao mecanismo, meus gestos ao digitar este artigo, embora obedeçam ao raciocínio, são mecânicos, porque o mecanismo das minhas mãos, braços e dedos permitem que eu escreva. Assim, uma açougueiro, quando desossa uma carne está exercendo uma atividade mecânica.

Deste modo, a separação mecânica de carnes não é nada além de um aproveitamento máximo e seguro da carcaça animal. A produção de carnes no Brasil e no mundo obedece à regras rigorosas de sanidade. Você já viu por aí um carro da EMATER? Pois é, trata-se de uma empresa pública de fomento que ajuda o produtor a melhorar suas condições de rebanho não só do ponto de vista da produtividade, como também da sanidade.

Já viu um carro do IMA? Então, é uma empresa pública mineira que trata, inclusive da defesa sanitária animal no campo e na indústria. Um carro do Ministério da Agricultura, já viu? Cabe ao Ministério da Agriculturas o trabalho de garantir que o animal que entra na linha de abate no frigorífico, esteja em boas condições sanitárias – inspeciona antes, durante e depois do abate. Já encontrou um carro da Vigilância Sanitária Municipal?

Cabe a ela cuidar das condições de armazenamento de manipulação nos açougues e supermercados, além de pequenas indústrias locais. De quantos escândalos de corrupção envolvendo estas instituições você já ouviu falar? Nenhuma, raras? Agora, pense no açougue, restaurante e supermercado de sua preferência. Estariam eles vinculados à uma patifaria ampla, geral e irrestrita de venda de carne podre e cheia de ácido e papelão?

Quando você compra qualquer coisa na feira ou no mercado e mesmo no açougue, você inspeciona o que está comprando? Analisa, apalpa, cheira, olha antes de comprar? Então, qualquer país do mundo que importa carne brasileira faz a mesma coisa – os EUA, a Alemanha, a França, A Inglaterra, a Rússia, a China, o Japão, o Canadá, a Argentina, a Colômbia, a Bolívia, a Venezuela, a Suécia, a Noruega, Israel, a África do Sul, enfim, mais de 150 países.

Todos eles com sofisticados controles de qualidade, altas tecnologias de detecção de fraudes e múltiplas exigências. Alguns países exigem que inspetores técnicos e até religiosos acompanhem todo o processo de produção e transformação da carne. E depois do acompanhamento, compram. Como você.

Certamente existem fraudes e falta de compromisso com a saúde pública, abates clandestinos, mas isso tem que ser tratado como são – desvios de conduta, exceções, como tem sido feito ao longo de todos estes anos pelos fiscais federais, estaduais e municipais. Cumprem suas funções com seriedade, eficiência e discrição.

Eventuais culpados tem que ser punidos, mas não se pode generalizar e jogar na mesma vala dezenas de milhares de empresas e profissionais responsáveis. Como o Brasil vive um tempo sombrio, a Polícia Federal anda combatendo carrapato botando fogo na vaca. Quem ganha com isso? Os que concorrem com o Brasil neste complexo e delicado mercado mundial e local. Da minha parte, já dei meu voto de confiança aos açougueiros que conheço.

Poços de Caldas os tem em quantidade e qualidade. Olhe para o dono e funcionários de um açougue em Poços e pense se são capazes de vender-lhe aqui-lo que a Polícia Federal sustenta que é a carne brasileira. Tenho certeza que a resposta é não.

Antes de encerrar esclareço que carne podre é irrecuperável, o tal papelão na carne é a embalagem, a carne de cabeça de porco é tão saudável como qualquer outra, sendo um dos pratos mais sofisticados no Chile. E o ácido? É o ácido ascórbico ou seu similar, um antioxidante muito conhecido também como Vitamina C.

* Paulo Tadeu é médico veterinário, ex-prefeito e vereador em Poços de Caldas. E-mail: paulotadeu@pocosdecaldas.mg.leg.br