Escola pública: avanços e desafios

continua depois da publicidade

Há inverdades que nos contam e que precisamos refletir sobre elas. É dito, por exemplo, que se alguém viajasse no tempo e visse a escola 100 anos depois, não encontraria diferença.

Continuaria a professora, os alunos, as carteiras enfileiradas, o quadro negro, como se nada tivesse mudado. O problema dessa falácia é o apagamento histórico de todos que lutaram pela escola e de todos os seus avanços.

Mas, quais seriam eles? Uma das principais mu-danças é que o estudo era condição pa-ra poucos. Final do século XIX, o Brasil tinha mais de 80% da população analfabeta, um país de economia essencialmente agrária, trabalhadores em sua maioria escravizados ou uma população rural pobre.

Daí que na construção de um país republicano, a política tratada como coisa pública, e não de uma família ou de privilegiados, a educação também começa a ser observada como responsabilidade do Estado.

É claro que o projeto nacional de educação não partiu da elite, mas de iniciativas da sociedade civil organizada e merece destaque o trabalho de in-telectuais, professores e gestores que organizaram o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova em 1932. Defendiam pro-postas em três aspectos principais: político, financeiro e pedagógico.

Na questão de organização política da escola, levantavam a bandeira da escola pública, gratuita e laica, que promovesse uma sociedade mais acessível a todos, mais democrática, afinal, o conhecimento seria democratizado.

Ao mesmo tempo que era importante a descentralização como forma da escola ter mais autonomia, isso não poderia significar um abandono dela a própria sorte no campo financeiro e daí que era fundamental que o Ministério da Educação criasse e cumprisse leis em relação a um percentual específico que fosse destinado para a educação.

Já no aspecto pedagógico, propunham um tratamento respeitoso entre professores e alunos, fomento a um protagonismo mai-or por parte dos estudantes, críticas ao enciclopedismo, autoritarismo, castigos físicos e humilhações empreendidas.

continua depois da publicidade

Além do Manifesto, mães reivindicavam mais creches, famílias lutavam por mais escolas, porque estudo era um tipo de ele-vador social. Nesse sentido, foi-se ampliando ao longo do século XX e início de XXI os investimentos para a democratização ao ensino, mesmo que com pou-co celeridade.

Portanto, se formos resumir, a escola atual não se parece com a escola de 100 anos atrás, em três aspectos principais. 1) Na questão de universa-lização, ao ponto de não haver nenhuma restrição para o ato da matrícula,; 2) Avan-ços significativos na relação professor/ aluno, não mais no medo, mas na criação de vínculos e de outras formas de abordar o conhecimento; 3 ) Acessibilidades de diversas ordens: livro didático, merenda escolar, alunos com deficiência com matrícula garantida, etc. Se é com base na luta que temos conquistas, quais então são os desafios atuais?

Será que temos respostas condizentes com os problemas? Um dos principais problemas é um baixo valor de CAQ, ou seja, de Custo Aluno Qualidade, que impacta diretamente na aula, diante da escassez de investimento estatal, seja para manutenção das escolas, construção de laboratórios de informática e de ciência, melhoraria no acervo da biblioteca, etc.

Por outro lado, quais foram as alternativas? Alegam que a aula está desinteressante, mudam o currículo no Ensino Médio e ainda liberam o home-scholling, sob argumento de que a família manifesta uma descrença em relação a educação regular e que sua vontade deve ser respeitada.

continua depois da publicidade

Consequência: quebra-se a ideia de projeto de nação no qual a escola tem fundamental importância na constituição de cidadãos e, por outro lado se isola novas gerações do encontro com seus contemporâneos. Outro problema é a falta do pagamento do piso, que como resultado, gera greve, e, dias seguidos sem aula. Solução óbvia: cumprimento da lei 11. 738/2008.

Mas, em contrapartida, o reajuste não é feito e, pelo contrário, os professores são culpabilizados, tratados como doutrinadores ou como ingratos por terem estabilidade empregatícia. Escondem que a estabilidade é uma garantia que mesmo que haja mudança de governo, os funcionários permaneçam e, portanto, ocorra a continuidade dos serviços prestados.

Também é importante diminuir a quantidade de alunos por sala. Isso traria a possibilidade de maior vínculo com os alunos, proximidade com suas demandas, planejamentos mais direcionados, e maior facilidade de po-tencializar o pertencimento de cada um com o grupo, haja vista que em turmas abarrotadas, alunos viram números e as situações de indisciplina são mais difíceis de contornar.

De maneira distorcida, trazem a pauta das escolas cívico-militar, como se questões pedagógicas se resolvessem nas mãos de militares.

Assim sendo, percebe-se que educação pública embora seja um direito na Constituição Federal de 1988, ainda é algo a ser permanentemente defendida, seja para contrapor falsas soluções, seja para que avance em suas pautas de inclusão e democratização do saber, na construção de sujeitos que se comprometam com um mundo mais igualitário, justo, fraterno e bonito de se viver.

* Ana Paula Ferreira é mestre em Educação e militante do Coletivo Educação. E-mail: anapaulakarenina@yahoo.com.br