Entrevista: Gustavo Bonafé
Após exercer primeiro mandato como vereador, ele se afastou da política
Gustavo Bonafé foi vereador em Poços de Caldas de 2016 a 2020. Para muitos sua reeleição era dada como certa. No entanto, fatores pessoais e profissionais o levaram a se afastar da política.
Hoje ele preside a ABACO (Associação Beneficente de Apoio à Comunidade) na Zona Sul e também lançou seu primeiro livro como escritor independente, o “Através do Norte”.
Nesta entrevista para a revista digital One Weekend, que o Jornal da Cidade reproduz abaixo, ele fala sobre seus projetos e, claro, não deixa de falar um pouquinho também sobre política.
Como você avalia sua passagem pela Câmara Municipal entre 2017-2020?
Bonafé – Extremamente positiva, ainda que não tenha alcançado aquilo que imaginei em um primeiro momento. Pessoalmente, foi uma experiência que trouxe muitos aprendizados que irei carregar por toda a vida, além de ter conhecido pessoas que faço questão de me manter próximo, pois sei que são engajadas em transformar realidades. Em termos de produção legislativa, também vejo com grande satisfação o que foi construído através do mandato: um dos gabinetes que mais produziu leis – a grande maioria com participação cidadã em todo processo e que hoje trazem mudanças importantes (meio-ambiente, transparência, combate à pedofilia e cyberpedofilia, dentre outras); foi o gabinete mais econômico de todos e foi uma atuação que não se sujeitou aos boicotes e barganhas entre poderes.
Passado o processo eleitoral, você se arrepende de não ter tentado a reeleição?
Bonafé – De maneira alguma, mesmo sabendo que tinha grandes chances de renovar o mandato. Foi uma decisão planejada, na qual pesou uma série de fatores pessoais e profissionais. Hoje, poucos meses depois, sinto-me muito mais preparado para gerar transformações na cidade, com uma nova missão: presidir voluntariamente a ABACO (Associação Beneficente de Apoio à Comunidade) na Zona Sul. Tenho aprendido que é possível desbravar diferentes caminhos para construir coletivamente soluções benéficas para comunidade.
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Ainda durante o seu mandato você trocou o PSDB pelo PDT, inclusive, apoiou o candidato Eduardo Junqueira para prefeito. Qual o motivo dessa movimentação política?
Bonafé – Buscava um projeto verdadeiro de desenvolvimento da cidade, mais do que apoiar um nome. Buscava também um ambiente aberto à co-construção e debates saudáveis de projetos e políticas públicas. Buscava um grupo sem interferência direta de detentores do poder, atuais ou historicamente falando, algo verdadeiramente disruptivo para construir um futuro diferente.
Tudo isso gerou a mudança. Há ressentimento com o PSDB local?
Bonafé – Não. Da minha parte sempre atuei com respeito ao partido e honrando minha função de fiscalizar o Poder Executivo. Nunca fechei as portas para o diálogo, pelo contrário, as portas do meu mandato sempre tiveram abertas e todas minhas votações vinham acompanhadas de justificativas com base técnica (de verdade). Nunca votei com tom de revanchismo, mesmo tendo meu mandato boicotado em diversos momentos. A responsabilidade pública é muito maior do que qualquer barreira pessoal que criam.
Na cidade há um comentário geral de que a atual legislatura da Câmara é melhor do que a anterior. Você concorda?
Bonafé – Só posso dizer que me lembro de euforia semelhante no início da minha legislatura com relação a anterior. Ainda é cedo para apontar qualquer certeza. Vejo com ótimos olhos diversos mandatos da atual Câmara, mas reforço o cuidado para que o desgaste nas relações internas não seja ainda maior. Em poucos meses, percebo um clima tenso e pesado entre os representantes, com opiniões individuais sendo várias vezes maiores do que a noção de que se está ali pelo coletivo. Isso pode apequenar uma Casa Legislativa, como muitas vezes ocorreu na legislatura que participei. Sobre esta, afirmo com muita consciência de que foi quase impossível trabalhar, tamanha a imaturidade com o cargo e submissão ao Executivo de vários representantes. Foram raros os colegas que conseguia dialogar com qualidade sobre políticas públicas e desenvolvimento social. Se não fosse a participação cidadã ativa durante o meu mandato e a qualidade da equipe de servidores da Câmara Municipal, com certeza seria uma experiência frustrante. Com muito trabalho, isso não ocorreu.
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Você lançou recentemente o seu primeiro livro como escritor independente, o “Através do Norte”. Em que momento você se sentou em frente ao computador e disse “é isso mesmo que quero fazer, vou ser escritor”?
Bonafé – O sentimento de poder me tornar um escritor veio depois da obra publicada e ainda estou me apropriando desta responsabilidade. Quando sentei em frente ao computador e comecei a escrever “Através do Norte” foi muito para cuidar de mim em um momento delicado. Era início da pandemia e as demandas de trabalho – que já eram desafiadoras – aumentaram demais, pois não me furtei em enfrentar o problema e buscar apoiar o município no desenvolvimento de ações. Então, reencontrei a escrita e começava o dia com ela. Tanto para acalmar a mente e centrar meu trabalho, quanto para poder resgatar momentos importantes de minha história (desde a infância até a vida adulta). Nasceu assim, o primeiro livro.
Em quanto tempo se deu o processo para que o livro se viabilizasse?
Bonafé – Comecei em maio de 2020 e finalizei o conteúdo no início de agosto. Sempre escrevendo cerca de 40 minutos por dia. Depois, veio o processo de revisão, correção, diagramação, detalhes finais da obra – algo que dá trabalho demais, mesmo com ajuda de um especialista (José Elias Neto). No fim de outubro ela estava impressa e pronta para ser lançada ao mundo – o que se deu em 18 de novembro, quando completei 32 anos.
Existe algum livro que você gostaria de ter escrito?
Bonafé – Sidarta, de Herman Hesse. É o tipo de livro que me encanta e me ensina algo a cada releitura. Simples na linguagem, profundo na mensagem.
E com relação a outros autores? O que anda lendo?
Bonafé – Ao longo de toda minha vida li muitos livros relacionados ao meu trabalho como facilitador em desenvolvimento humano dentro do mundo das organizações. Porém, nos últimos tempos tenho me dedicado a ler escritores e escritoras brasileiras de um passado nem tão longínquo. Machado de Assis tem me encantado cada vez mais. Clarice Lispector é sempre uma experiência a parte e Cecília Meireles fomenta meu impulso escritor.
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Ao adquirir o “Através do Norte”, a pessoa recebe workshops, podcasts e lives. Como se deu essa idéia?
Bonafé – Surgiu depois do livro pronto, a partir de uma reflexão: “não quero ser um escritor distante dos leitores. Leu o livro e acabou!”. Quero estar próximo, trazer outros estímulos de desenvolvimento que possam apoiar novas experiências, decisões, caminhos de cada um que entrasse em contato com a obra. Então, todos os meses estou compartilhando algo novo, ouvindo quem meu leu e aprendendo ainda mais sobre o próprio trabalho que desenvolvo. Além desses conteúdos complementares, também há uma ação social: cada exemplar vendido garante que uma criança e sua comunidade familiar/escolar receba orientação para o combate à pedofilia e a cyberpedofilia; uma parceria com o projeto Anjos – Aprender para se Defender (Rio de Janeiro).
Para o futuro, ainda há espaço para o Gustavo Bonafé político?
Bonafé – Há sempre espaço para o Gustavo Bonafé empreendedor social. E se a política se apresentar novamente como oportunidade de contribuir com Poços, farei com muita alegria.
Qual a sua mensagem para os jovens que pensam em entrar na política?
Bonafé – Se aproxime aos poucos da política antes de qualquer decisão. Participe de organizações que lidam diretamente com questões sociais, acompanhe o trabalho de Conselhos Municipais que chamam sua atenção, busque conversar com pessoas que fazem parte da política (por meio de cargo eletivo ou não), fiscalize um vereador ou vereadora, busque formação e educação política que te permita desenvolver uma maturidade de diálogo e amplie seu olhar sobre a diversidade de uma comunidade. Encontre uma rede ou grupo que possa fortalecer seu aprendizado! A política precisa dos jovens. E os jovens precisam da política. Se você se preparar para assumir esse desafio, vai dar tudo certo.