Decisão favorável à Magalu traz segurança para ações afirmativas
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As ações afirmativas voltadas à inclusão a pessoas negras no mercado de trabalho devem ter um novo impulso com a decisão judicial de novembro passado que declarou ser constitucional o trainee para candidatos negros da Magalu.
A avaliação é da consultora de diversidade, equidade e inclusão (DE&I) Letícia Rodrigues, (imagem) sócia-fundadora da Tree Diversidade, empresa que na manhã de ontem (18) promoveu um treinamento dirigido a profissionais de DE&I e recursos humanos interessados em estruturar em suas empresas ações afirmativas similares.
“Se alguém tem dúvida, pode fazer. O trainee para pessoas negras e outras vagas afirmativas são constitucionais e legais”, encorajou Rodrigues. “Os processos seletivos tradicionais têm vieses”, disse em referência ao racismo estrutural que ainda privilegia geralmente candidatos brancos, homens e cisgêneros no acesso às melhores vagas. “Se continuarmos a fazer as coisas como sempre, os resultados não serão diferentes. A ação afirmativa ainda é necessária para fazer as empresas inclusivas”, prosseguiu.
Lançado em 2020, o trainee da Magalu foi a primeira ação afirmativa exclusiva para pessoas negras de que se tem notícia no Brasil encabeçada por uma empresa privada. A seleção dividiu as redes sociais, gerando de um lado aprovação pela iniciativa e, de outro, acusações contra a varejista de “racismo reverso”. O assunto chegou a ser um dos trending topics do Twitter, com a hashtag #MagazineLuizaRacista. A iniciativa da varejista, assim como as de outras empresas, motivou ainda uma avalanche de processos judiciais, muitos deles peticionados ao Ministério Público do Trabalho de São Paulo, que indeferiu todas as solicitações.
Um desses processos, no entanto, movido pelo defensor público Jovino Bento Junior, chegou até a 15ª Vara do Trabalho de Brasília. Na petição, Bento Junior pedia que a empresa fosse obrigada a não fazer contratações segundo “critérios de raça”. Na peça, o defensor ainda classificou o trainee da Magalu como “marketing de lacração” e exigiu da empresa uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 milhões.
A ação foi julgada improcedente. Para a juíza do caso, Laura Ramos, o trainee tem respaldo jurídico. Segundo ela, o Estatuto da Igualdade Racial permite a empresas criar ações contra desigualdades raciais. Além disso, a igualdade, prosseguiu a magistrada, é fundamento tanto do Estado Democrático de Direito quanto da Constituição Federal de 1988, sendo o trainee da Magalu considerado “não discriminatório”.
Para Letícia Rodrigues, a decisão trouxe segurança jurídica para que empresas pudessem retomar, por exemplo, o anúncio de vagas afirmativas sem medo de processos judiciais. “Pode falar que é exclusivo [para profissionais negros ou qualquer outro grupo minorizado], pode recomendar candidatura de pessoas de determinados grupos”, assegurou.
A consultora seguiu as recomendações dizendo que as empresas devem reformular seus processos de contratação, procurando combater vieses inconscientes que acabam priorizando determinados perfis profissionais. Também recomendou que as empresas estabelecessem metas de recrutamento de profissionais dos perfis minorizados.
No caso das empresas que utilizam o recrutamento às cegas, em que profissionais são selecionados com base na experiência, sem identificar no início da seleção características como gênero, idade, raça, faculdade onde se formou, há ainda outros cuidados a tomar.
“O filtro no início da seleção é eficaz para torná-la mais diversa, mas, em algum momento, o candidato terá contato com o selecionador. E aí podem entrar em ação os vieses inconscientes, seguindo necessárias algumas políticas afirmativas”, finalizou.