Como o mundo se lembrará de Mikhail Gorbatchov, o primeiro e único presidente da URSS?

O último líder da URSS morreu na noite de 30 de agosto em Moscou, aos 91 anos

Mikhail Gorbatchov (também grafado como Gorbachev) nasceu em 2 de março de 1931 e, como ele mesmo se lembrava, iniciou, quando ainda era estudante, “um longo processo de repensar a história do país que se estendeu por anos”.

Sua ascensão ao cargo mais alto da URSS, o de secretário-geral do Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), equivalente ao cargo de presidente, em muitos outros países, deu-se em 11 de março de 1985.

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E não foi surpresa para outros altos funcionários soviéticos: Gorbatchov tinha boas relações com Leonid Bréjnev e com outros líderes do país e demonstrava ótimos resultados como ministro da Agricultura da URSS.

O ambicioso líder era amado por seu povo e pelos governos de países ocidentais, e prometeu realizar muitas mudanças.

Em 1991, um ano depois de receber o Prêmio Nobel da Paz pelo “seu papel de liderança no processo de paz”, ele disse: “Na hora de aceitar o cargo mais alto do país, o de secretário-geral do Comitê Central do PCUS, percebi que é impossível continuar a viver assim, e não me permitirei permanecer neste cargo se não for apoiado na implementação de mudanças fundamentais”.

Muitas dessas mudanças fundamentais foram realizadas, mas nem todas foram aceitas ou compreendidas.

A campanha contra o alcoolismo, por exemplo, que buscava a sobriedade de uma população que morria devido ao uso abusivo de bebidas, foi o primeiro passo difícil dado pelo novo secretário-geral no caminho à Perestroika (reconstrução), seguido por um expurgo massivo de altos funcionários públicos e o rejuvenescimento do partido no poder.

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Mais tarde, Gorbatchov pôs fim ao sistema de partido único da URSS, à exclusividade do PCUS garantida pela Constituição, instaurou as eleições no país (realizadas seguindo um modelo democrático), e pôs um fim à perseguição aos chamados “dissidentes”.

Gorbatchov trouxe o acadêmico exilado Andrei Sakharov de volta ao país e prosseguiu com a reabilitação das vítimas das repressões de Stálin que não tinham sido reabilitadas sob Nikita Khruschov.

Seu principal mérito foi proclamar a liberdade de expressão e o fim da censura. Após a chegada de Gorbatchov ao poder, as tiragens de jornais ultrapassaram a cifra dos milhões, o PCUS e os governantes se tornaram pela primeira vez objeto de crítica pública.

Posteriormente, Gorbatchov foi culpado pela reforma da liberdade de expressão: supostamente, ela teria despertado a autoconsciência nacional, levando, assim, ao colapso da URSS.

Sem essa liberdade, o país e o mundo provavelmente não saberiam tão cedo sobre o desastre nuclear de Chernobyl, um dos capítulos mais tristes na biografia política de Gorbatchov, junto com o conflito em Nagorno-Karabakh, a entrada de tropas no Azerbaijão e a dispersão de manifestantes em Alma-Ata.

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O mundo, porém, sem dúvida, se lembra de Gorbatchov como o homem que parou a corrida armamentista e transformou o “Império do Mal” em um aliado na prevenção de cataclismos geopolíticos e ambientais.

Foi ele quem proclamou o “novo pensamento de política externa”, iniciou o processo de reunificação alemã e retirou as tropas soviéticas do Afeganistão.

Foi ele quem expressou a ideia, que parecia uma utopia absoluta, de eliminar as armas nucleares até o ano 2000 e criar sistemas internacionais de segurança, assinou o tratado Start-1 e o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário com os Estados Unidos.

Durante uma reunião em Malta, Gorbatchov pôs fim à Guerra Fria em nível diplomático, mas, mais tarde, foi acusado de perder essa guerra.

Gorbatchov respondeu: “Queremos ser compreendidos […] isso não significa que devemos nos tornar exatamente iguais aos outros, mas nos tornarmos compreensíveis aos outros”.

Após sua renúncia, ele continuou monitorando o desenvolvimento do país, estabeleceu a Fundação Gorbatchov e a Cruz Verde Internacional, tentou retornar à grande política, mas na eleição presidencial teve apenas 0,51% dos votos.

O único presidente da URSS entrou em forte oposição com o primeiro presidente da Federação Russa, Boris Iéltsin, depois apoiou seu sucessor, Vladimir Putin – embora não por muito tempo -, e entrou em uma fase de introspecção e admissão de erros.

“A Perestroika venceu! Fui eu quem perdi como político”, resumiu em 2009. Embora, talvez, ele tenha formulado e expressado uma das principais conclusões em 1991: “A vida é muito mais rica e complicada do que os planos mais perfeitos de como torná-la melhor. No final, ela vinga cruelmente a imposição forçada de esquemas sobre ela, mesmo as que foram criadas com boas intenções.”

Material produzido pelo projeto Russia Beyond, com autorização para o Jornal da Cidade. Confira aqui o link original.