50 anos de cinema e contestação

Se para Zuenir Ventura 1968 foi o ano que não acabou, 1969 também foi um ano de contestações artísticas.

Mesmo que o festival de Woodstock, que completa exatos 50 anos na semana que vem, esteja longe de ser algo significativo na mudança estrutural da sociedade, ali celebrou-se o ápice do que se chamou de contra-cultura, ou se fechou este período com chave de ouro.

No mesmo ano, enquanto no dia 16 de junho era lançado no Brasil Perdidos na Noite (Midnight Cowboy), com Jon Voight e Dustin Hoffmann, no dia 14 de julho era lançado, nos Estados Unidos, Sem Destino (Easy Rider), com Peter Fonda, Dennis Hopper e Jack Nickholson.

Longe de ter a apuração cinematográfica de grandes amigos, como Daniel Souza Luz, Marcelo Leme e Lucas Marciano, além da minha esposa, sempre elenquei Easy Rider como o maior filme estadunidense de todos os tempos, até que assisti Perdidos na Noite.

Interpreto que ambos passam a mensagem de marginalidade: enquanto Wyatt (Peter Fonda) e Billy (Dennis Hooper) traficavam drogas em troca de um mundo alheio à relação de trabalho, Joe Luck (Jon Voight) aven-turou-se na carreira de garoto de programa de mulheres em troca de ganhar dinheiro fácil em Nova Iorque.

Enquanto Wyatt e Billy morreram pelo cano da espingarda de rancheiros preconceituosos a fim de imporem suas virilidades ao mundo, Joe Buck e Ratso (Dustin Hoffmann) terminam na tentativa de se reconstruírem nos negócios do prazer em Miami depois de se submeterem a condições sub-humanas no último andar de um prédio abandonado e condenado.

Tudo isso num país onde mais recentemente Barack Obama, quando candidato a presidente, disse ser tudo possível. Para mim, portanto, o grande barato de Easy Rider e Perdidos na Noite: a denúncia de que no país mais rico do mundo há sim pobreza e estereótipos que levam à exclusão de seres humanos.

Meio século se passou e as denúncias de Easy Rider e Perdidos na Noite continuam atualíssimas: no país onde “todas as coisas são possíveis”, tudo pode acontecer; inclusive, ser morto pelo que se é ou passar por condições de penúria humana onde a todo tempo se propagandeia a ideia de que basta trabalhar duro ou é possível encontrar saídas inusitadas para se dar bem na hora de ganhar dinheiro.

* Lucas Rafael Chianello é advogado e jornalista. E-mail: blogchianellico@gmail.com