Betim denuncia uso de documento falso em cobrança de dívida
A longa briga judicial entre a Prefeitura de Betim (Região Metropolitana de Belo Horizonte) e a empresa Andrade Gutierrez, por causa de uma dívida de 1982 que estaria sendo cobrada indevidamente do município, ganha agora mais um capítulo. Segundo afirmou o prefeito Vittorio Medioli, em audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (29/10/19), a assinatura do ex-prefeito Osvaldo Franco, que reconheceu a dívida, num documento de 1982, é falsa.
A equipe do procurador-geral da cidade, Bruno Ferreira Cypriano, teria recebido uma denúncia indicando a falsidade da assinatura nesta segunda-feira (28), quando a população de Betim também saiu às ruas em manifestação contra a empresa e a cobrança da dívida. A falsidade, segundo os documentos apresentados pelo prefeito Vittorio Medioli e sua equipe, seria clara. Alem de a assinatura ser diferente, no documento, o nome do prefeito vem grafado de maneira incorreta, com W em vez de V.
A prefeitura, que já tem diversas ações na justiça contra a cobrança da Andrade Gutierrez, inclusive alegando falsidade de documentos, agora vai voltar a recorrer a todas as instâncias novamente, juntando aos autos a perícia nas assinaturas, segundo o procurador Bruno Cypriano.
A dívida, que hoje estaria em torno de R$ 480 milhões de reais, seria decorrente de restos a pagar de obra realizada pela empresa em Betim, entre 1979 e 1982. Mas, segundo Vittorio Medioli, há documentos que comprovam que a prefeitura já pagou muito mais do que valia a obra, e que, agora, a empresa é que deve ao município.
O prefeito exibiu, ainda, uma série de documentos com resultados de investigações que comprovariam que existe, dentro da Andrade Gutierrez, uma estrutura específica só para forjar dados e “fabricar créditos falsos“. “É muito mais fácil inventar créditos do que fazer obras”, declarou Vittorio Medioli. Ele usou termos como “falcatrua, crime absurdo, ardil sem limites”, para se referir à suposta falsificação da assinatura do ex-prefeito, já falecido.
Seu sucessor na prefeitura, o ex-deputado Ivair Nogueira, teria reconhecido novamente a dívida, ainda em 1991, mas sem nenhuma contestação ou verificação, apenas com base no documento que teria sido assinado por Osvaldo Franco.
Outro fato que reforça a tese da prefeitura de que houve uma série de irregularidades no processo é uma declaração recente do ex-secretário municipal de Governo de Osvaldo Franco, José Roberto Marcelino, de que a falsificação de documentos para permitir a cobrança da dívida teria sido feita por pessoas indicadas pela Andrade Gutierrez para integrar a administração municipal na época.
O presidente da Comissão de Participação Popular, deputado Doutor Jean Freire (PT), o autor do requerimento de audiência, deputado Coronel Henrique (PSL), e o deputado Professor Irineu (PSL) prometeram empenho para que a justiça reconheça as irregularidades e reverta a situação em favor do município. Os parlamentares também sugeriram uma visita à direção da empresa, para discutir o assunto.
Apoio – A audiência da Comissão de Participação Popular foi realizada no Auditório SE da Assembleia, mas teve de ser exibida em mais dois espaços da sede do Poder Legislativo, para que centenas de moradores que vieram de Betim pudessem assistir. Vereadores, líderes comunitários e de movimentos sociais da cidade manifestaram apoio à luta do prefeito contra a empresa.
Por causa da dívida alegada pela Andrade Gutierrez, o município, que já decretou calamidade pública e financeira, pode ter suas contas bloqueadas pela justiça, se não pagar mais 48 milhões de reais à empresa, até o dia 5 de novembro, conforme explicou o procurador-geral. Os valores seriam as parcelas mensais de precatórios, referentes aos meses de janeiro a agosto de 2019. Isso tornaria a situação financeira do município insustentável, segundo o prefeito.
“Essa cobrança é um crime. Tem quase 6 mil crianças que ainda não conseguimos colocar nas creches, por exemplo, e tem gente morrendo nas filas à espera de cirurgias de hérnia e de vesícula, que não conseguimos realizar”, declarou Vittorio Medioli.
O deputado federal Weliton Prado (Pros-MG) também destacou a importância de evitar que esse dinheiro saia do caixa da cidade, penalizando ainda mais as pessoas pobres e que precisam dos serviços públicos. O parlamentar citou investigação do Tribunal de Contas da União, feita a pedido dele, que também teria acusado irregularidades na cobrança da dívida.
A moradora do bairro PTB, em Betim, Valdirene Pimenta, integrante do Conselho Municipal de Saúde, manifestou seu repúdio à cobrança da empresa e pediu à população que se mantenha alerta. “Somos trabalhadores, pagadores de impostos”, disse ela.
Hélio Dutra, da Associação Comunitária da Colônia Santa Izabel, também criticou a Andrade Gutierrez e defendeu a prefeitura. Os médicos que atendiam os pacientes da colônia já foram retirados, em função da situação financeira de calamidade do município.
O deputado Celinho Sintrocel (PCdoB) sugeriu que os parlamentares peçam ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que suspenda imediatamente qualquer bloqueio de recursos de Betim. “Não podemos aceitar nada que penalize ainda mais as prefeituras”, afirmou.