A Festa de São Benedito
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Os registros históricos sobre Poços de Caldas são muito importantes porque há muita coisa escrita por antigos moradores que tiveram o cuidado de registrar as suas impressões sobre a época em que viveram.
Isso aconteceu com intelectuais como Pedro Sanches de Lemos, David Benedicto Ottoni, Mário Mourão, Homero Ottoni, Benedictus Mário Mourão e com os inúmeros jornais que circularam desde 1889 até os dias atuais.
Ao fazermos referência à tradicional manifestação religiosa, que é a Festa de São Benedito, apoiamo-nos nos autores mencionados e em algumas publicações de época que registraram os fatos e a evolução do tempo.
O jornal Município de Caldas, nº 96, de 12 de maio de 1901, publicava na sua página 3 o seguinte convite:
“Festa
Realiza-se amanhã, nesta cidade, a festa do glorioso São Benedito, sendo grande desde hoje a concorrência de fieis que, de todos os pontos circunvizinhos afluem à cidade. Constam os festejos de missa cantada, sermão e procissão. Percorrerá as ruas da cidade o tradicional congado, havendo embaixada à Praça José Bonifácio.”
Nessa época, a localidade de Poços de Caldas era um distrito de Caldas e, em relação à Igreja Católica, era um Curato.
Mário Mourão, em seu livro Síntese Histórico-social, fala sobre a chegada, no final do século XIX do negro Herculano Cintra, proveniente de Amparo, São Paulo, trazendo “um pequeno capital” com o qual adquire uma chácara na Rua Sergipe.
Em sua bagagem trouxe a imagem de São Benedito, que era guardada em sua casa, em um oratório, mantendo sempre uma lâmpada acessa. Segundo o historiador Homero Benedicto Ottoni, em seu livro Poços de Caldas: “Em Sessão Plenária de 7 de outubro de 1902, a Câmara autorizou Herculano Cintra a edificar a capela de S. Benedito”.
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No ano de 1906, Herculano Cintra procurou a mãe de Mário Mourão, dona Herculana Mourão, devota de São Benedito, e ambos uniram seus esforços com o de outras pessoas da comunidade e construíram a primeira capela de São Benedito no espaço do velho cemitério, na antiga Rua Marquês de Herval, hoje Rio Grande do Sul.
Esse espaço é ocupado na atualidade pela Basílica de Nossa Senhora da Saúde. Ainda nas palavras de Mourão, a primeira Festa de São Benedito na recém-construída capelinha, aconteceu no ano de 1907, “sob os auspícios de tio Herculano e do Raimundo Mourão, um cearense que foi escravo do meu pai…”
“Em 1907 era enorme o número de pessoas de cor residentes em Poços de Caldas e assim a festa de S. Benedito, realizada na sua capelinha, tinha uma grande concorrência, com a dança dos Caiapós e dos Congos, que surgiram juntos na tradicional festa da cidade.” (Mourão, 1951, p.351)
Mas pesquisando no jornal Revista de Poços, nº 2, de 28 de março de 1904, editado por José Augusto de Paiva Teixeira, encontramos a seguinte nota na qual há o registro de uma data anterior à mencionada por Mourão:
“FESTA DE SÃO BENEDITO
Os abaixo assinados festeiros do glorioso São Benedito, nesta localidade, têm a honra de avisar a todos os fieis que a festa se realizará no dia 13 de maio vindouro, constando de novenas com leilões de prendas, missa cantada e procissão solene. Em todas as solenidades tocará a banda de música dirigida pelo professor Israel Breves dos Santos. Esperam os abaixo assinados que a festa se realize na própria capela de S. Benedito. Ao mesmo tempo os festeiros apelam para a generosidade deste bom povo, pedindo-lhe um óbolo ou uma prenda para os respectivos leilões, a fim de que possa aquele Santo ser condignamente comemorado. De S. Benedito esse mesmo povo receberá a devida recompensa.
Poços de Caldas, 24 de março de 1904
D. Augusta Cândida de Moraes – Virgílio Teixeira da Fonseca”
Houve também, danças de Congado e de Moçambique. Apesar dos preparativos intensos, aconteceu certa desavença entre o padre Luiz Cappello e os organizadores da festa por razões financeiras.
Em virtude desse episódio, o padre Luiz Cappello foi substituído pelo padre Thierry de Albuquerque, vindo do Curato de São João da Boa Vista.
Com o passar do tempo a capelinha de São Benedito tornou-se pequena para abrigar os seus devotos e foi demolida por iniciativa do padre Eduardo Batista que, num esforço único contando com a doação do terreno feita pelo coronel Agostinho Junqueira e o apoio financeiro dos moradores e devotos, construiu a atual Igreja de São Benedito e a inaugurou no ano de 1927.
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Segundo a historiadora Nilza Megale, no seu livro Memórias Históricas de Poços de Caldas, à página 147, “No ano de 2000 o bispo de Guaxupé interrompeu a realização da festa uma vez que houve certo desvio com relação aos objetivos do evento.
Comerciantes inescrupulosos estavam usando de maneira indevida o espaço destinado às barracas”. Salientamos que a parte religiosa e folclórica da festa não foi afetada.
O prefeito Paulo Tadeu D’Arcádia e o Secretário de Serviços Urbanos Francisco Fernandes regulamentaram o uso do adro e do entorno a Igreja. Dessa forma a situação foi normalizada a partir de 2001.
No ano de 2020, por força da pandemia que assola o mundo, a Festa deixou de acontecer, no sentido de preservar a população face a aglomeração que acontece, seja no desfile dos ternos de congado, seja pelas atividades que acontecem no adro da igreja de São Benedito, quais sejam as quermesses, as barraquinhas e as brincadeiras para crianças.
Importante lembrar que no ano de 2020 a manifestação completaria a sua 116ª edição, com isso houve a interrupção apenas duas vezes – em 2000 e 2020.
Nem mesmo com a gripe espanhola houve paralisação nos anos de 1918 e 1919. Neste 2023, por força dos registros que encontramos, a festa está no seu 119° anos se levarmos em conta o registro contido no jornal Revista de Poços.
Bibliografia utilizada na pesquisa:
JUDICE, Luiz Roberto. A Gripe Espanhola em Poços de Caldas, Sulminas, 2006
MEGALE, Nilza Botelho. Memórias Históricas de Poços de Caldas, 2ª. Edição, Sul Minas, 2002
MOURÃO, Mário. Poços de Caldas: Síntese Histórico-Social, Ed.do autor, SP, 1952
OTTONI, Homero Benedicto. Poços de Caldas, Editora Anhembi, São Paulo, SP, 1960
Jornal Revista de Poços, números 2 a 10, de 28 de março a 22 de maio de 19-04, diretor: José Augusto de Paiva Teixeira.
Jornal Município de Caldas, nº 96, de 12 de maio de 1901, diretor: Martiniano de Carvalho
* Hugo Pontes é professor, poeta e jornalista. E-mail: hugopontes@pocos-net.com.br