Poços quando de Caldas

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Antigas fazendas que deram origem ao território de Poços de Caldas foram registradas em Caldas no ano 1856

Existiram diversas fazendas no território que hoje pertence ao atual município de Poços de Caldas, antes mesmo da existência do núcleo que deu origem à cidade.

Algumas delas constaram nos registros paroquiais de terras da freguesia de Caldas, em 1856: ou seja, dezesseis anos antes da criação do município de Poços, que se deu em 1872.

Na época, Poços pertencia à Caldas. Registros como esses foram realizados em todo o Império do Brasil, entre 1854 e 1857, em atendimento a um decreto de 1854 que regularizou dispositivos da Lei de Terras de 1850.

Essa foi a primeira legislação sobre a propriedade fundiária no Brasil, antes dela existiu apenas a Lei de Sesmarias, do Período Colonial. Seu principal objetivo era criar uma legislação moderna para o país instituindo a propriedade privada da terra e garantindo ao Estado o domínio sobre as ditas “terras devolutas”.

Sua eficácia no concernente ao domínio estatal foi questionável. O principal resultado que legou foi a legitimação da propriedade privada e a garantia de expansão da mesma, sobretudo para os grandes fazendeiros.

Na região da antiga freguesia de Caldas foram registradas ao menos duas fazendas que deram origem a território do atual município de Poços de Caldas: a da Fazenda do Chapadão e a Fazenda do Barreiro.

Ambas eram grandes propriedades, com mais de 400 hectares, e pertenciam a membros de uma família sul mineira de grande expressão política e econômica: os Junqueira.

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Segundo Reynaldo de Oliveira Pimenta, o primeiro a se estabelecer na Fazenda Chapadão teria sido o guarda-mor Antônio Rabelo de Carvalho, no ano de 1792.

Ele era filho de uma das famosas três Ilhoas, aclamadas por genealogistas como matriarcas de diversas famílias do Sul de Minas. Posteriormente, de acordo com Antônio Carlos Lorette, entre 1815 e 1822, partes de terras no Chapadão foram adquiridas pelo alferes José Francisco Junqueira.

Uma das filhas do alferes, Ana Francisca Junqueira, se casaria com o supracitado Antônio Carvalho. Ainda de acordo com Lorette: “para a obtenção de madeiras de lei, tiveram que recorrer a terras distantes da chapada, prolongando o tempo de construção da sede da fazenda, inaugurada em 1838”.

Com extensa mão de obra escrava, a propriedade especializou-se na criação de gado vacum da raça caracu. Também cultivavam mantimentos para o sustento da casa. Em 1855 faleceu o guarda-mor, e sua esposa, conhecida como “Ana do Chapadão”, tomou frente nos negócios da família.

Nos registros paroquiais de terras da freguesia de Caldas constaram diversas declarações informando que as “terras e campos que formam a fazenda Chapadão” estavam “ainda em comum com outros sócios”, sobretudo herdeiros e coherdeiros.

Porém, a maior parte da fazenda foi aquela declarada por Ana Francisca Junqueira, que em 1856 registrou 480 alqueires de terras (2.323,2 hectares), o que a enquadrava entre os maiores proprietários da região. Ana do Chapadão era filha de José Francisco Junqueira, esse, por sua vez, foi proprietário da fazenda Bela Cruz, em Cruzília (MG), na qual ocorreu uma das maiores revoltas escravas que se tem notícia na História do Brasil.

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Segundo estudo recente de Marcos Ferreira de Andrade, que investiga há décadas a denominada “Revolta de Carrancas”; Ana teria levada para sede da Chapadão e fixado “no mourão da porteira da entrada do curral” um dos crânios de escravizados assassinados durante a revolta, buscando assim coibir levantes semelhantes em sua propriedade.

Talvez antes mesmo da vinda de Ana do Chapadão, outros membros da família Junqueira já buscavam terras na região de Caldas. Segundo Reynaldo Pimenta, em 1819 José Bernardes da Costa Junqueira (primo em primeiro grau de Ana), requereu sesmaria “na paragem do Pinhal no sertão que fica entre as serras das Caldas, e o Rio Pardo”.

Mais tarde ele vendeu as terras a seu irmão, o major Joaquim Bernardes da Costa Junqueira, e mudou-se para Franca (SP). Em 1821, um tio deles, o padre Francisco Antônio Junqueira, também recebeu uma sesmaria na região. Segundo o Dr. Benedictus Mário Mourão, a fazenda do Barreiro foi formada pelo major Joaquim Bernardes da Costa Junqueira.

Primeiramente ele teria construído sua sede próxima ao atual bairro da Vila Cruz, em Poços de Caldas. Depois, devido ao fluxo contínuo de banhistas que procuravam os benefícios das águas sulfurosas, o major mudou-se, e construiu uma nova sede, do outro lado da Serra de São Domingos (onde hoje ainda existe a fazenda do Barreiro, porém sem a antiga casa).

No ano de 1856 Joaquim Bernardes declarou sua propriedade ao pároco da freguesia de Caldas: a fazenda do Barreiro, ainda em comum com outros sócios, contendo 917 alqueires de matos e 1080 alqueires de campos (em um total de 9.665,48 hectares de terras).

Tratava-se de uma gigantesca propriedade, a quarta maior extensão de terras registrada na freguesia de Caldas. Posteriormente, no ano de 1872, pressionado pelo governo provincial, o major Joaquim Bernardes Junqueira se viu obrigado a doar parte de suas terras para a fundação do atual município de Poços de Caldas.

Esses dados foram coletados e analisados no âmbito da pesquisa entre campi intitulada “Sertões a oeste do Rio Sapucaí: história, patrimônio e cultura material (sécs. XVIII-XIX)”, coordenada pelos professores Isaac C. Ribeiro (Machado) e Tarcísio de Souza Gaspar (Muzambinho), e teve como bolsista o discente Gabriel Silva Fernandes (ADM, Machado), a quem agradeço pela transcrição dos registros.

* Isaac Cassemiro Ribeiro é professor doutor no Campus Machado do IF Sul de Minas. E-mail:  isaac.ribeiro@ifsuldeminas.edu.br