CPI questiona presidente sobre plano para privatizar Cemig

Presidente admite ter passado pelo crivo do Partido Novo antes mesmo de conhecer Zema

O papel do diretor-presidente da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Reynaldo Passanezi Filho, na suposta estratégia de desmonte e descrédito da empresa com o objetivo de viabilizar politicamente a sua privatização, deu o tom da maioria dos questionamentos feitos nesta sexta-feira, 11, ao Executivo.

Ele prestou depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) criada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para investigar possíveis irregularidades na gestão e o uso político da estatal.

Diversos deputados questionaram a racionalidade e a legalidade de uma série de decisões administrativas em que o depoente esteve envolvido, a começar por sua escolha pela Exec, empresa de headhunter (seleção de executivos) supostamente ligada a dirigentes do Partido Novo, o mesmo do governador Romeu Zema.

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Ao responder aos questionamentos do relator da CPI da Cemig, deputado Sávio Souza Cruz (MDB), o presidente da estatal admitiu que, por orientação da Exec, teve de se submeter a uma entrevista ao empresário João Amoêdo, fundador e candidato a presidente pelo Novo em 2018, antes mesmo de ter suas credenciais checadas pela Cemig e ter conhecido o governador.

PRIVATIZAÇÃO
Uma das principais linhas de investigação da CPI da Cemig dá conta de que Reynaldo Passanezi seria apenas um preposto para romper resistências internas e externas e pôr em prática o plano do governo estadual de privatizar a estatal, conforme intenção exposta em diversas manifestações públicas do governador.

Essa suposta estratégia foi alvo de críticas contundentes do presidente da CPI da Cemig, deputado Cássio Soares (PSD).

“O governador tem o direito legítimo de tentar pôr em prática aquilo em que acredita, mas não pode depreciar a Cemig para tentar privatizá-la por menos do que seu real valor de mercado, como ele tem feito em todas as entrevistas que concede. Pra vender um carro você exalta as qualidades dele, não diz que ele está com o motor fundido e os pneus carecas. E afinal já são três anos de Governo Zema, tempo suficiente para retomar a eficiência da empresa”, aponta Cássio Soares.

“Foi a sua experiência no sucateamento e privatização de empresas públicas que contribuiu para sua vinda para a Cemig?”, emendou Sávio Souza Cruz, ao lembrar o currículo profissional do depoente, que teria participado, ainda nos anos 1990, da privatização e concessão de diversos serviços públicos no governo paulista.

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ACAREAÇÃO
Entre outros temas polêmicos, ao final de quase quatro horas de depoimento, o presidente da Cemig admitiu a possibilidade de participar de uma acareação com o ex-diretor-adjunto de Suprimentos, Logística e Serviços Corporativos da Cemig, João Polati Filho.

A sugestão foi do relator Sávio Souza Cruz, em alusão a denúncia recebida pela CPI em depoimento colhido em setembro do ano passado. Na ocasião, João Polati relatou aos deputados ter sido insistentemente pressionado pelo superior a “encontrar uma forma” de manter a empresa AeC no call center da companhia energética do Estado, mesmo após ela ter perdido a licitação para o serviço.

A AeC foi fundada pelo então secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico do governador Romeu Zema, Cássio Azevedo, já falecido, o que seria mais um indício do cerco partidário à Cemig. “Eu nego. Seguramente jamais fiz isso”, afirmou Passanezi.

Na sequência, a AeC, após a saída de Polati da Cemig, foi subcontratada para continuar prestando o mesmo serviço para a Cemig, mas desta vez por meio da IBM Brasil. Também sem licitação, a multinacional de tecnologia vai receber R$ 1,1 bilhão por um contrato de dez anos.

O triângulo Partido Novo, Exec e Cemig foi tema recorrente do depoimento. O executivo foi confrontado pelo relator da CPI por ter supostamente contratado por R$ 170 mil a empresa que o selecionou, a Exec, em mais uma das inúmeras convalidações (contratação sem licitação e paga após a prestação do serviço) citadas que teriam se tornado rotina em sua gestão.

Passanezi justificou que se absteve de votar na reunião da diretoria executiva que sacramentou a decisão. Sávio Souza Cruz, então, questionou o depoente sobre de quem teria sido a decisão inicial de contratar a Exec, ao que o presidente da Cemig não soube responder.

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“Só recebi uma ligação, não sei nem como conseguiram meu número”, disse o presidente. “Nenhum depoente que veio aqui sabe dizer isso. Esse é um mistério insondável. Por que então não mandaram a fatura para o Governo de Minas pagar?”, ironizou o relator.

A deputada Beatriz Cerqueira (PT) denunciou uma suposta dívida do Partido Novo com a Exec, o que levaria à utilização da Cemig como fachada para repasses financeiros, já que o vínculo entre eles se estenderia à seleção de secretários de Estado, outros dirigentes de empresas públicas e até mesmo dos candidatos do partido em Minas e outros estados.

“O Governo de Minas diz que não paga pelos serviços e a Exec não consta como prestadora de serviços do Executivo. Mas a Exec prestou serviço para tanta gente e quem sempre paga a conta é a Cemig, daí nossa insistência nesse ponto”, afirmou a parlamentar.

Segundo o já apurado pela CPI da Cemig, os serviços remunerados da Exec também teriam sido utilizados em outras ocasiões pela estatal para contratação de outros executivos, e, em alguns casos, teriam sido contratados os indicados pelo presidente Reynaldo Passanezi, conforme admitiu.

O vice-presidente da CPI da Cemig, deputado Professor Cleiton (PSB), questionou o depoente sobre o motivo do não afastamento da gerente de Compras de Materiais e Serviços da Cemig, Ivna de Sá Machado de Araújo, no âmbito de uma suposta denúncia ao Ministério Público de desvios na área de compras da estatal. Outros cinco servidores de carreira seguem afastados pelo mesmo motivo.

“Justamente a responsável pela licitação que deu origem à denúncia não foi afastada”, reforçou Professor Cleiton. Na ocasião, a depoente alegou que, na época em que as investigações foram deflagradas, ela ocupava outro cargo, na área de gestão de imóveis da empresa, versão referendada por Reynaldo Passanezi.