Em nome de Deus?

O dia 21 de setembro de 2021 fica marcada por uma estranha e funesta combinação de comportamentos vergonhosos que estão a exigir nosso pronto repúdio e determinada ação no sentido de buscar reparação política e judicial.

No plano internacional o vexame do presidente brasileiro desfiando uma cadeia inacreditável de mentiras diante do olhar espantado de outras lideranças mundiais.

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Trata-se do descerebrado que afirma e dissemina a ideia que é melhor um filho morto que homossexual, que mulheres nascem por fraquejada do homem (revelador de estranha preferência de um mundo só de homens) e que homens brancos não se casam com negras se forem bem educados.

Em Brasília, desorientado pela firmeza da inquirição na CPI da pandemia, o ministro da CGU Wagner Rosário, esperou a oportunidade para despejar seu desespero e descontrole sobre uma senadora.

Em Poços de Caldas, em “nome de Deus”, um grupo de vereadores apresentou uma moção para que a Assembleia Legislativa acate um veto do governador a uma emenda ao PL 2.316, que estabelece punições a empresas que discriminem, coajam ou atentem contra direitos das pessoas em razão da orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero.

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Vejam bem, “em nome de Deus”, vereadores entendem ser legal e aceitável que empresas discriminem, coajam ou atentem contra direitos destas pessoas. Gostaria de compreender em que fonte essa gente bebe para trazer certezas arrogantes sobre pessoas que têm uma orientação sexual diferente.

“Em nome de Deus”, pela convicção desta gente, pessoas com orientação sexual, identidade ou expressão de gênero diferentes da sua, não devem ser protegidos pela lei, abandonados à própria sorte, o que no limite leva ao abandono, ao isolamento e à morte precoce.

“Em nome de Cristo”, não se abalam com a trágica longevidade dos transsexuais no Brasil – 35 anos! Porque faltam para eles empatia, amparo legal, e solidariedade cristã. Presos à um fundamentalismo de oportunidade, opressor e far-sesco, lideranças supostamente religiosas apontam o dedo pesado de intolerância e preconceito para os “diferentes” para se apresentarem mais cristãos que os outros.

Em quase nada diferem do fascista General Franco que mandava cegar pombas para ficarem imóveis aos seus pés em seus discursos, para parecer-se ungido pelo Espírito Santo.

A pérola local do 21 de setembro vem pela fala do vereador Claudiney que afirmou que a “ideologia de gênero” é mais nefasta que o nazismo e o fascismo! À parte a indigência intelectual que se refere à inexistente ideologia de gênero, relativizar a monstruosidade do fascismo e nazismo é crime, é apologia contra a democracia, contra a diversidade e contra vida. Não pode ser tolerado sob pena de acumpliciamento com a fala teatrológica e cruel.

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A ministra Rosa Weber, em um voto antológico, afirmou – “O direito à própria individualidade, e à própria identidade, aí compreendidas as identidades sexuais e de gênero, traduz um dos elementos constitutivos da noção de pessoa humana titular de direitos fundamentais […].

O direito à autodeterminação sexual decorre diretamente do princípio da dignidade da pessoa humana”. Quem fala a língua de Deus? Quem respeita o ser humano, sua diversidade e direito individual quanto à orientação sexual e identidade de gênero, sua proteção legal ou a soberba travestida de fé, que quer impor suas próprias regras à sociedade como um todo.

São Matheus recomenda e ensina – “Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: ‘Deixe-me tirar o cisco do seu olho, quando há uma viga no seu? Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão.”

* Paulo Tadeu é ex-prefeito de Poços de Caldas, ex-vereador, médico veterinário e presidente do Diretório Municipal do PT. E-mail: ptsdarcadia@gmail.com