Sul de Minas reivindica trem da Mantiqueira
Cidades do Circuito das Águas e da região das Terras Altas da Mantiqueira, no Sul de Minas, estão unidas no esforço para recuperar a ligação ferroviária entre elas e, delas, com o Estado de São Paulo. Para discutir o assunto, lideranças locais participaram, nesta quinta-feira (24/10/19), de audiência da Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Atualmente, já existe trem turístico ligando Soledade de Minas a São Lourenço, num trajeto de dez quilômetros do chamado Trem das Águas. Também será inaugurado no início do próximo ano trecho de 20 quilômetros entre São Lourenço e São Sebastião do Rio Verde. Na sequência, há 25 quilômetros abandonados até Passa-Quatro, onde o transporte de turistas é retomado até a divisa com São Paulo.
Esse intervalo, que passa por Pouso Alto e Itanhandu, foi, justamente, o tema da audiência, requerida pelo deputado Gustavo Mitre (PSC), vice-presidente da comissão. Ele salientou que o trecho é da União e não está concedido a nenhuma empresa, o que facilitaria a cessão para o projeto de extensão da malha turística.
Sonho – Vários vereadores de Itanhandu, além do prefeito Evaldo Ribeiro de Barros, participaram da audiência e expressaram o sentimento da cidade, de expectativa de resgate do transporte ferroviário na região, marcado também por fatos históricos como a Revolução Constitucionalista de 1932, que tomou o Túnel da Mantiqueira, por onde passa a linha férrea.
O prefeito de Pouso Alto, Juliano Cláudio da Silva, reiterou que o sonho é o mesmo na sua cidade. Outros municípios da região também enviaram representantes.
Órgãos públicos prometem parceria
Órgãos da administração pública que têm interface com as ferrovias também estiveram representados e se colocaram à disposição dos prefeitos. Frank Alves Nunes, da Superintendente do Patrimônio da União (SUP-MG), deixou claro que o órgão não criará dificuldades para repassar os imóveis e trechos de interesse aos municípios ou a instituições caracterizadas como Oscips. A SUP “herdou” o patrimônio não operacional da antiga Rede Ferroviária Federal.
O mesmo foi feito por Ana Carolina Jeronymo, chefe da Unidade Ferroviária de Belo Horizonte do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), que detém o material rodante devolvido à União pelas concessionárias. Também a superintendente de Transporte Ferroviários de Minas Gerais, Vânia Silveira de Pádua Cardoso, se dispôs a ajudar nas autorizações necessárias.
O deputado João Leite (PSDB), presidente da comissão, enfatizou a importância dessas relações. “Ninguém faz retomada ferroviária sem parceria com municípios ou com organizações sociais”, destacou.
Inspiração – Municípios já atendidos por trens turísticos no Sul de Minas relataram, na audiência, a experiência de implantação desse modal e os benefícios trazidos pela iniciativa. O vereador Natanael Paulino de Oliveira, de São Lourenço, lembrou a ligação entre a cidade e Soledade de Minas, feita em 2000, com grande impacto positivo.
O caso mais recente, de São Sebastião do Rio Verde, foi compartilhado pelo prefeito Sandro Lisboa Martins, que contou sobre a dificuldade na elaboração do projeto e sobre a peregrinação pelos órgãos públicos para conseguir autorizações, trilhos, máquinas e ainda o financiamento, feito parcialmente pela Companhia de Desenvolvimento Econômico do Estado (Codemig).
A obra foi cotada em R$ 7,8 milhões, mas, segundo ele, a prefeitura teve que enxugar gastos e assumir outros. Ainda assim, Sandro comemora a implantação do projeto, que já traz reflexos antes mesmo de sua finalização. Também se diz feliz por contagiar outros municípios com o sonho da volta do trem.
“Já observamos um aquecimento imobiliário e de negócios. O trem trouxe também a necessidade de recuperação de áreas de floresta e de uma ponte antiga sobre o Rio Verde, que gera um bom ICMS cultural para o município”, detalhou.
Financiamento e operação são desafios
O deputado Ulysses Gomes (PT) salientou a possibilidade de financiamento dos novos projetos também pela Codemig, a partir da solução do impasse com a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), a respeito da exploração do nióbio em Araxá (Alto Paranaíba). “A Codemig é a principal parceira dos trens turísticos, iniciativa que respeita a vocação do Sul de Minas”, reiterou.
O diretor de Fomento à Mineração, Energia e Infraestrutura da Codemig, Renato de Souza Costa, prometeu esforço para viabilizar os projetos, mas salientou que os recursos do nióbio são do Estado. “Há uma sistemática para se fazer esse investimento, conforme relato do prefeito Sandro”, frisou. Segundo ele, só após a decisão governamental de se fazer o investimento, a área técnica da Codemig faz as análises necessárias.
Já a gestora da Associação Terras Altas da Mantiqueira, Cristina Costa Figueiredo Motta, informou que já está elaborando projeto para captação de recursos para o trecho faltante na região.
Operação – A implantação de um trem turístico demanda ainda uma empresa ou instituição que opere o sistema. Por isso a audiência contou com a participação de Bruno Crivelari Sanches, diretor-presidente da Associação Brasileira de Preservação Ferroviária (ABPF), que opera os trechos Soledade de Minas-São Lourenço e Passa-Quatro até a divisa com São Paulo, além de outros trens turísticos no País.
Fundada em 1977 por um francês inconformado com a destruição do patrimônio ferroviário brasileiro, a ABPF tem sete regionais no País, uma delas no Sul de Minas, onde gera 50 empregos diretos. Ela ainda cuida de 80 quilômetros de trilhos e de 22 estações com recursos próprios e realiza operações compartilhadas com concessionárias. “A conexão completa com São Lourenço é peça-chave para o turismo na região”, opinou.