Porque a tarifa zero no transporte coletivo é inadiável e viável
continua depois da publicidade
Muitas cidades do Brasil têm implementado a gratuidade no transporte coletivo para solucionar uma crise crônica de, pelo menos, duas décadas e meia.
Esta política pública é um imperativo: mais cedo ou mais tarde todas as cidades terão que aderir – e mais, o governo federal terá que assumir sua parte na gestão e financiamento.
Aliás, quanto mais cedo os municípios aderirem, maior a chance de salvarem esta valiosa e indispensável política de mobilidade urbana e justiça social.
Alguém já me perguntou – mas porque é inadiável e imperativo? Tomemos como exemplo nossa bela e querida Poços de Caldas.
Há cerca de vinte, vinte e cinco anos, a concessionária de transporte coletivo transportava pelo menos três vezes mais pessoas que atualmente – cerca de dois milhões de passageiros por mês (equivalente a vinte, vinte e cinco mil pessoas com média de três passagens por dia).
Hoje, transporta menos de setecentos mil mensais (oito mil pessoas por dia com a mesma média de trechos percorridos).
É importante ressaltar que tal decadência se deu por diferentes razões – aumento de custos, mudança no perfil do emprego e modais de transporte, como carros populares, motocicletas, bicicletas, entre outros.
Esta queda se deu apesar de todos os esforços do poder público em buscar uma tarifa justa e equilibrada e das muitas e infrutíferas adequações da empresa.
Aqui, até mini terminais urbanos foram construídos, embora fossem um fracasso previsível. A equação não fecha. Menos passageiros significam menos faturamento com praticamente os mesmos custos; quanto mais alto o custo de operação, mais cara a passagem; quanto mais cara a passagem, menos passageiros; menos passageiros, mais cara a tarifa.
continua depois da publicidade
Portanto, a recuperação do transporte público como direito fundamental do cidadão, para trabalho, comércio, serviços ou lazer, passa pelo fim da cobrança das passagens.
Gratuidade significa mais gente transportada – mais gente transportada, mais acesso ao trabalho, serviços e lazer e menos carros nas ruas e avenidas.
A outra pergunta recorrente é a que segue – “tudo bem, mas de onde virá o dinheiro?”. Não vou repetir a resposta cre-tina dada há nem tanto tempo – “quando a gestão é boa, o dinheiro aparece”, embora seja perfeitamente adequada neste caso.
Vamos aos números do descalabro administrativo de Poços de Caldas. A arrecadação da prefeitura em 2023 foi de cerca de 970 milhões de reais, descontados os recursos para composição do FUNDEB.
Os gastos com folha de pagamento foram da ordem de 436 milhões e com “outros serviços de terceiros” mais 253 milhões.
Serviços de terceiros abrangem despesas com assinaturas de periódicos, TV, diário oficial, direitos autorais, advocacia especializada, arquitetura, medicina especializada, engenharia, armazenagem, locações diversas, perícias, manutenção e conservação de imóveis, máquinas, equipamentos, estradas, ruas e avenidas, congressos e festas, etc.
No nosso caso é preciso somar os valores milionários gastos com serviços terceirizados na saúde, uma torneira aberta e descontrolada.
Em 2020, Poços de Caldas gastou 136 milhões com outros serviços de terceiros. Em 2021, 151,6 milhões, um salto de 10,3%.
Em 2022, 186, 6 milhões, outro salto de 23,2 %. Em 2023, inacreditá-veis 253 milhões de reais – um salto gigantesco de 36%!
Em três anos o aumento de transferência de dinheiro público para o setor privado através de “serviços de terceiros” foi de mais de 117 milhões, um crescimento ciclópico de 86%!
Se considerarmos que o custo anual da tarifa zero em Poços de Caldas, cotejadas com outras cidades que já adotaram a política, ficaria em torno de 55-60 milhões no máximo (metade do evidente desperdício), é na gestão de gastos com serviços de terceiros e outras fontes, inclusive privadas, que sai o dinheiro para a gratuidade do transporte coletivo seja uma realidade.
A gratuidade no transporte coletivo é medida urgente a ser tomada. Ou como diz a moçada- “Busão 0800 já!”.
* Paulo Tadeu é ex-prefeito, ex-vereador, médico veterinário e presidente do Diretório Municipal do PT