Killing Joke

O jornalista Daniel Souza Luz escreve sobre a banda Killing Joke, uma de seus preferidas e que influenciou grandes nomes do rock.

Tinha que ir ao show. O Killing Joke é um dos meus grupos favoritos. É daquelas bandas que não são conhecidas do público em geral, mas que influenciaram muito grandes nomes que fãs de rock n’roll conhecem bem: o Metallica fez uma versão de uma música, The Wait, do primeiro álbum deles, ainda nos anos oitenta; um dos grandes sucessos do Nirvana, Come As You Are, é um plágio assumido de um pequeno hit do Killing Joke chamado Eighties; no segundo disco da Legião Urbana o riff de Change, também do primeiro disco do KJ, é citado nos acordes iniciais de Fábrica.

Além disso, exerceram nítida influência em inúmeros outros pesos-pesados, em especial do metal identificado como industrial, como o Helmet, Prong e Ministry, além de grupos de hardcore mais inventivos, como o Amebix. Apesar de ter influenciado muitos sons mais barulhentos e pesados, o Killing Joke é um grupo pós punk, surgido no fim dos anos setenta, inicialmente com uma pegada até mesmo de dub reggae, e que fez história nos anos oitenta, especialmente entre góticos.

Ou seja, não é uma agremiação convencional, de forma alguma. Em 2018 engendraram uma turnê para comemorar os 40 anos de carreira, tocando com a formação original. E veio a surpresa: pela primeira vez, tocariam no Brasil.

Meu amigo Bruno Karnov avisou-me sobre o show em fins de março deste ano. Ficamos anos falando a respeito da vontade de vê-los ao vivo. Com o falecimento dele, em meados do ano, tornou-se questão de honra para mim ir neste show. No domingo da semana passada, dia 23 de setembro, de última hora, sem planejamento, tendo isso em mente, aproveitando-me de uma viagem para São Paulo, mandei uma mensagem para amigos de Bauru, onde cursei a universidade, que tinham comprado as entradas meses antes, perguntando se ainda havia ingressos na bilheteria. Tinha.

Eles até tiraram uma foto com o vocalista Jaz Coleman na porta. Peguei um táxi e bora lá. Colei na grade, do lado esquerdo, próximo de onde o guitarrista Geordie tocaria. Meu coração, para a minha surpresa, bateu forte como o de um adolescente.

Notei que o músico de apoio, um tecladista, apareceu no palco; logo eles entraram também e mandaram de cara seu grande sucesso, Love Like Blood, cantada em uníssono pelo público. Não estavam preocupados em construir um show com aquela grande catarse no fim do bis, já queimaram pouco depois Eighties, a outra música mais conhecida. Sabiam que tinham uma grande carreira a expor.

A apresentação foi curta, apenas uma hora e vinte minutos. Foi o único senão para um show que comemora quatro décadas. Para a decepção de alguns, não tocaram músicas do último disco. Pylon, de 2015, ou dos álbums mais acessíveis, do final dos anos oitenta. Alguns singles, como Democracy, New Day e Seeing Red, também fizeram falta.

Mas para o meu deleite, privilegiaram músicas dos primeiros discos, como Wardance, Requiem, Primitive e Butcher, esta com o timbre do baixo que lembra Joy Division, de quem são contemporâneos, muito bem reproduzido, para o meu fascínio. Em Blood-sport, música semi-instrumental do primeiro disco, de 1980, o público fez o coro, que meio que replica uma torcida de futebol, e Jaz mandou um monólogo fascinante: “O dinheiro caça, ele tem sede, quer sangue” e seguiu nessa toada sombria.

Em Autonomous Zone, mais no começo, disse que o que mais importa é a liberdade, o que calou fundo neste momento conturbado. O importante é que o show foi um momento de encontros e reencontros.

Pena que não consegui conversar com o baixista Youth, que estava perto de mim na saída, mas teve que ir embora. Encontrei-me com Jaz, Geordie, o baterista Paul Fergunson e o tecladista na porta.

Para a minha surpresa, pois é uma banda muito circunspecta, estavam conversando e tirando fotos com todos os fãs, na maior simpatia. Não me fiz de rogado e troquei ideia com todos.

Além dos amigos de Bauru presentes, Samuel, Tati, Juninho e Jeferson (não via os dois primeiros há mais de dez anos), também reencontrei vários amigos de São Paulo que conheci por intermédio do Bruno, ou que só conhecia virtualmente, Alessandro, Katy, Maria, Ricardo e Gabi. Isso sim foi catártico.

* Daniel Souza Luz é jornalista e revisor. E-mail: danielsouzaluz@gmail.com