Ordem do Dia 15/12/23

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Na coluna Ordem do Dia, o historiador, advogado e cientista político Marco Antônio Andere Teixeira faz uma breve análise sobre fatos do dia. 

A indicação de Dino e Gonet, respectivamente, ministro do STF e Procurador-Geral do MPF, mostrou dois fatos incontroversos: o tamanho da oposição ao governo Lula, no Senado. E o principal ponto de desgaste entre os poderes. Vamos por partes.

A oposição ao governo soma mais de trinta senadores. Num universo de 81. Não precisa fazer muita conta. A oposição supera os 30% (chegando a 40%, conforme se pondera) dos senadores – e seria uma oposição qualificada. Resta esclarecer o tipo de qualificação.

Senadores, ou políticos em geral, não são qualificados por suas virtudes intelectuais, morais ou profissionais. Não mais. Mas por suas filiações políticas, corporativas, religiosas e ideológicas. E, sobretudo, por seus interesses. Para o bem, ou para o mal, é assim que é.

A qualificação religiosa seria a questão mais complicada. E pode parecer pouco republicana e até mesmo atrasada, ou mesmo inconstitucional (dada a laicidade do Estado). Mas tem peso enorme.

E esse peso se reflete em temas relativos ao aborto, a princípios dessa ou daquela religião, ou às práticas sexuais das pessoas, entre outras questões dessa natureza. Parece estranho. E é.

Hoje temos sérias controvérsias, em questões absolutamente incongruentes com os imperativos da Administração Pública. Sendo crenças que são refratárias a qualquer tipo de composição política, pois, a rigor, não são dessa natureza.

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São questões de fé – e fé não se negocia, ou se compõe, politicamente. Eis o busílis. A cultura árabe, por exemplo, hoje tida como atrasada, já foi a mais desenvolvida do mundo, do ponto de vista tecnológico e científico. Basta consultar a História para se ver isso. Por que decaíram?

A resposta mais simples, seria atribuir essa decadência à mistura entre política, religião e administração pública. Não deu certo para os árabes. No Brasil não tem sido diferente.

Tanto isso é verdade, que não foram poucas as vezes em que Dino citou trechos bíblicos para se posicionar – e se defender do assédio religioso de alguns senadores. Que maluquice seria essa? O homem vai ser juiz ou padre?

É certo que ambos usam saia. Mas as semelhanças param por aí. Outro ponto de desgaste não seria propriamente o ativismo judicial, que teria no STF sua expressão máxima. Seria o período de tempo em que isso pode perdurar, sendo um ministro do STF “imexível”.

O que explicaria a menor pressão sobre Gonet, cuja permanência na Procuradoria é temporária. E relativamente curta. Dino não foi o campeão da rejeição no Senado.

O mais rejeitado foi André Mendonça. Curiosamente, um religioso “terrivelmente evangélico”, como diria seu padrinho Bolsonaro.

Temas religiosos e posições perenes, não sujeitas a renovação num tempo razoável, são elementos estranhos à dinâmica da política republicana.

Muito menos, seria razoável estabelecer, como critério de escolha de um ministro do STF, uma exigência de ordem religiosa. Como foi o caso de André Mendonça. Uma contradição incontornável, numa República laica.

Por outro lado, o poder Judiciário teria um perfil “monárquico”, considerando as garantias dadas aos seus membros.

Não há muitos limites para o exercício da função, muito menos controle. Se parecem com “déspotas esclarecidos”. Intocáveis. Talvez seja hora de se tratar disso.