Cocteau Twins
O jornalista e revisor Daniel Souza Luz escreve sobre a banda Cocteau Twins
Etéreo e onírico são adjetivos já muito desgastados para descrever a sonoridade do Cocteau Twins. Para mim, ao ouvi-los pela primeira vez, parecia muito mais do que isso.
Era magia, algo impossível de ser feito com instrumentos musicais, pois soou como uma cornucópia de todas as belezas do mundo. Um feito inumano perpetrado por humanos que tiveram uma epifania, ou, melhor ainda, uma teofania. Um encontro com Deus(es).
Como vários bons sons que marcaram minha vida, conheci através do programa Som Pop, apresentado por Kid Vinil, na TV Cultura. Em 1990 ele passou dois clipes do Cocteau Twins. Recordo-me, mesmerizado, do deleite proporcionado pelas músicas e também pelas imagens.
Um foi Carolyn’s Fingers e o outro foi Iceblink Luck. São obras-primas belíssimas. Escoceses, lembro-me bem de uma entrevista deles publicado pela revista Bizz, nos anos oitenta. Diziam que moravam num lugar tão deprimente que fizeram música para escapar, para não enlouquecer. Fizeram bem.
Típico grupo pós punk do começo dos anos oitenta, começaram lançando discos independentes que seduziram os chamados góticos que pululavam à época. No entanto, as sobreposições sonoras e os vocais líricos de Liz Frazier, tidos como operísticos por alguns jornalistas oitentistas, os distinguiam facilmente da trupe qualificada como dark.
Aos meus ouvidos, soam como predecessores da geração shoegaze, embora nunca tenha visto alguém fazer esta comparação, pelo uso abundante dos efeitos que, segundo consta, não conseguiam reproduzir fora de estúdio. Nos anos noventa, já lançando discos por uma grande gravadora, as músicas se tornam ainda mais delicadas.
Sem o vigor, ou, melhor dizendo, sem aquela atmosfera lúgubre do decênio anterior, já não combinavam mais com aquela década barulhenta. Recordo-me de ver um trecho de show deles no programa Lado B, na MTV, em 1996. Entrevistados pelo jornalista Fábio Massari, contam a respeito de uma fã que desistiu deles, mas que levou a avó ao show; essa senhora passou a vê-los com frequência. Foi simbólico.
Encerraram as atividades em 1997. Agora que me aproximo da terceira idade, talvez seja a hora de reavaliar o conjunto da obra e não só o fascínio que me proporcionaram na adolescência, na virada dos anos oitenta para os noventa.
* Daniel Souza Luz é jornalista e revisor. E-mail: danielsouzaluz@gmail.com